quinta-feira, 17 de junho de 2010

RESENHA: “OS BRUTOS”, JOSÉ BEZERRA GOMES

GOMES, J. B. Os brutos. 3 ed. Natal, RN: Sebo Vermelho, 2007. (clássicos potiguares)



O Rio Grande do Norte teve um grande privilégio em ter em seus acervos literários e culturais obras de um grande escritor, José Bezerra Gomes. Esse norte-rio-grandense nascido numa pequena cidade do seridó, chamada de Currais-Novos, publicou obras belíssimas dentre as quais se destaca Os Brutos (romance literário regionalista da década de 30). Os Brutos foi a primeira publicação de José Bezerra Gomes, no ano de 1938. (Cf. GURGEL, 2000 )

Por se tratar de uma obra regionalista e o autor se engajar na tendência literária de sua época, Os Brutos retrata a vida dura das pessoas que viviam no sertão potiguar assolado por secas durante boa parte do ano, e por vezes estendendo-se ao ano seguinte. Embora a maior parte do enredo ocorra na cidadezinha de Currais-Novos, os problemas retratados por Bezerra Gomes são problemas constantes a todas as regiões da década de 30: pobreza, desigualdade social, ainda se via algumas famílias com ares feudais da aristocracia. Os grandes fazendeiros eram quem concentravam a maior parte do dinheiro que circulava por ali. Em contrapartida se tinha famílias trabalhando em terras alugadas, simplesmente por comida e moradia. Num cenário mais regionalista o Rio Grande do Norte vivia o ciclo do algodão, onde muitos fazendeiros conseguiram enriquecer-se plantando e vendendo algodão em grandes quantidades para a capital, Natal, e os pequenos agricultores viam uma ótima oportunidade de tentar fazer pequenas fortunas.
 
Seu Tota era o maior fazendeiro da cidade. Comprava algodão na folha a um preço baixo e vendia todo para Natal. Esse negócio lhe rendeu tanto dinheiro que já não sabia mais as dimensões das terras que tinha. Era o único da cidade que tinha um carro e um chofer particular para fazer suas viagens a Natal. O chover de seu Tota era Jesus, um homem elegante que só andava bem vestido. Não trocava nem um pneu do carro. Era o chofer e não lhe competia fazer outros serviços a não ser dirigir. Era sem dúvida um homem elegante e tinha muitas namoradas não só na capital, mas em Currais-Novos também.
 
José Bezerra Gomes retrata em Os Brutos não só o cotidiano de um personagem, mas um conjunto de situações que são características de pessoas que moram numa cidade pequena do interior. Então o livro traz muitas expressões regionais típicas dos interioranos reproduzidas por Gomes. Como por exemplo: escuro de tudo, o açude do governo tinha sangrado (p.13). O autor também faz uso de estereótipos, ou seja, ele caracteriza cada personagem de acordo com a vivência do mesmo naquela sociedade. Como exemplo de estereótipos o leitor pode ter a personagem Rica, caracterizada pelo autor como uma mulher da vida, que andava muito bem vestida e tinha grande prestígio entre as outras mulheres da vida. Ela tinha até uma vida de mulher casada.
 
Outro ponto que Bezerra Gomes ressalta no desenrolar do enredo, bem típico entre os homens daquela época, é o poder que o homem tinha quando saía com muitas mulheres. Não importavam se pegariam doenças ou não, e se pegassem seria motivo de orgulho. Exibiriam suas mazelas com todo prazer do mundo num tom superior de que era homem e os homens fazem isso.
 
Na história, tio Lívio, como era conhecido o tio do personagem principal, Sigismundo, tinha vindo se tratar das doenças que tinha pegado por sair com mulheres da vida. O miserável agora padecia o mesmo que seu sobrinho, estava como hóspede na casa de seu irmão, mas na companhia de uma cunhada insuportável. Como não bastasse tanto sofrimento, tio Lívio mata Rita com uma facada por saber que a puta estava lhe traindo com o chofer de seu Tota. Acaba preso e na prisão perde sua sanidade mental e morre ali mesmo.
 
A obra é dividida em 25 capítulos e embora tenha quebra de sequenciação entre um capítulo e outro, é possível se ter um encadeamento lógico de idéias a partir da compreensão e interpretação do leitor. No final do livro o autor não dá por acabado o enredo, pois famílias vão tentar a vida na região sul. Ouvia-se muito falar que lá estava dando bastante dinheiro trabalhar nas lavouras de café e cana-de-açúcar. Então se faz necessário, propositalmente, que o leitor abra um horizonte para o desfecho do enredo. Como seria a vida dessas famílias numa região diferente da sua? Teriam lá a oportunidade de mudar de vida?...Nem sempre é assim.
 
José Bezerra Gomes teria tudo para ser um autor bem conceituado na literatura brasileira. Suas obras chegam bem próximas das obras de Machado de Assis, sobreturo na questão do realismo e do apreço pela descrição de tipos e situações. E como os leitores podem perceber, ao ler Os Brutos, Gomes, assim como Machado de Assis, não os poupa da crueza na linguagem. Mas o nosso currais-novense morreu bem cedo, aos quarenta anos de idade. Sem dúvida o Rio Grande do Norte perdeu um grande nome promissor na carreira literária brasileira.
 
Argeu Cavalcante Fernandes

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